Bem Vindo às Cousas

Puri, se tchigou às COUSAS, beio pur'um magosto ou um bilhó, pur'um azedo ou um butelo, ou pur um cibinho d'izco d'adobo. Se calha, tamém hai puri irbanços, tchítcharos, repolgas, um carólo e ua pinga. As COUSAS num le dão c'o colheroto nim c'ua cajata nim cu'as'tanazes. Num alomba ua lostra nim um biqueiro nas gâmbias. Sêmos um tantinho 'stoubados, dàs bezes 'spritados, tchotchos e lapouços. S'aqui bem num fica sim nos arraiolos ou o meringalho. Nim apanha almorródias nim galiqueira. « - Anda'di, Amigo! Trai ua nabalha, assenta-te no motcho e incerta ó pão. Falemus e bubemus um copo até canearmos e nus pintcharmus pró lado! Nas COUSAS num se fica cum larota, nim sede nim couratcho d'ideias» SEJA BEM-VINDO AO MUNDO DAS COUSAS. COUSAS MACEDENSES E TRASMONTANAS, RECORDAÇÕES, UM PEDAÇO DE UM REINO MARAVILHOSO E UMA AMÁLGAMA DE IDEIAS. CONTAMOS COM AS SUAS :







domingo, 29 de novembro de 2009

Nim d'aprupósito!

Muito recentemente, ao abrigo da pesquisa de outras "cousas", fui dar de caras com uma dissertação apresentada como Tese de Mestrado em Linguística à Universidade do Minho. Versava a dita sobre o "falar da região da Terra Quente" e a "cousa" despertou-me, naturalmente, a atenção. Como somos um concelho com umas especificidades muito próprias, caso a Tese remetesse para o "falar da região da Terra Fria", a "cousa" geraria idêntico fenómeno. Penso que já por aqui disse que o concelho de Macedo é um género de hermafrodita edafoclimático, parte Terra Fria, parte Terra Quente, parte Zona de Transição. E ainda temos um "umbigo do mundo" e duas serras acima dos 1000m, uma a norte e outra a sul, para confundir mais a coisa. E um microclima encravado na freguesia de Sesulfe que origina uma "pinga" de se lhe tirar o chapéu (ou, neste, caso, a rolha) e outro, lá para os lados do noroeste concelhio, de onde sairia a rima "De onde são as uvas que tão bons vinhos dão? Arcas, Nozelos e Vilarinho de Agrochão". Acrescentando-lhes a ilha ambiental que representa o tão nosso Azibo ("tão nosso" porque vou ouvindo e lendo "alguas cousas" que o fazem derivar para um concelho do setentrião). Como em termos geográficos, ou se cai para um lado, ou para outro, estamos incluídos na Terra Quente, e não há discussão. Mesmo que, fazendo uso do conterrâneo Pires Cabral, nem que o diabo viesse ao enterro um habitante de Soutelo Mourisco, Bousende ou Murçós ficaria convencido que faz parte da Terra Quente. Mais não fosse, pela "carambina", pelos "candiólos" ou pelas "scarabanadas". Mas pronto... Também temos Pauliteiros e não fazemos parte da Terra de Miranda... Retomando a Tese e o falar... Vem agora a Associação Portuguesa de Linguística a atribuir o prémio de Melhor Trabalho de Português a um tal «Unidades e Processos Fonológicos da Região da Terra Quente: contributos para a Linguística Forense». Soou-me a familiar... E não é que é a dita Tese que tanto tinha enchido de orgulho o meu pulsar transmontano? E que, para lá dessa particularidade, ainda me facultou a possibilidade de diminuir um pouco mais a minha ignorância? Particularmente no que respeita a algo que, há cerca de três meses, transmitia com paixão ao grupo no qual estava inserido, numa "tertúlia de copos e lembranças de velhos tempos": vamos preservar o "Dialecto Transmontano"? Fui olhado como se tivesse descoberto, casualmente, a pólvora. Mas não... Já no séc. XVII, o emigrado Manuel Faria e Sousa dizia, na sua «Epitome de las Historias Portuguesas», que «Los transmontanos hablan nuestro idioma con grande corrupción». Não sei o que o "Manel" queria dizer com "corrupción" mas, com ou sem a dita, o que os transmontanos falam é Português escorreito, com umas derivações que não se restringem à fonética. Já o grande Leite de Vasconcellos, a finalizar o séc.XIX, nos legava, no seu "Mapa dialectológico", as diferenças que representam o falar transmontano (e ainda lhe acrescentava um subdialecto, ao qual apelidava de "Falar de Macedo e Mogadouro"!). Caso algum interessado pretenda perceber o alcance da existência de um dialecto transmontano, basta fazer uma incursão a algumas aldeias e abeirar-se de algum ancião. Ou, caso não se queira dar ao trabalho, poderá dedicar uns parcos minutos às boas-vindas das Cousas... Caso opte por esta alternativa, perderá, contudo, a oportunidade de provar, in loco, os frutos das tradições transmontanas. Algo que, a manterem-se as tendências dos últimos anos, há-de ter o mesmo destino que teve a tradição da cultura da seda. Já não hão-de ficar nenhumas ruínas de um qualquer "Real Filatório", mas hão-de restar outro género de vestígios, mais não seja por via das novas tecnologias digitais. A génese das "Cousas" está, precisamente, aí. Nasceu "pra botar ó mundo as cousas que bão sendo albidadas". "Pra q'num s'albidim"... Mesmo que, por qualquer eventualidade em que a persistência finasse, finassem por inerência as "Cousas", vai surgindo quem aprecie a falta de "erudição" na forma de um "parolo" falar para que a mortalha não surja... Particularmente para o tal Dialecto Transmontano ou, como dizem os meus descendentes, de forma orgulhosa, quando me apanham com expressões que me brotam dos genes: «- Estás a falarE à MacedUE!!!». «- Cum munto gostoE!». O mesmo gosto que me adveio do incentivo que representou um recente mail: «Para mim sem dúvida o uso daquelas palavras que eram a expressão dos nossos antepassados deixam-me fascinada». Com "compensação" infeliz no desgosto dos autóctones que me dizem não perceber metade das boas-vindas... Entre "mortos e feridos", se não se salvar o Dialecto Transmontano, que se salve, "ó menos", o Fumeiro Transmontano. "Caralhitchas, q'mim bôs stão o butelo e as casulas secas!" P.S. - Já quase me esquecia de duas "cousas"... Dar os parabéns à Joana Aguiar (Escola Superior de Educação do IPB) pela magnífica Tese! E agradecer à "minh'ábó" por me ter ensinado o que era uma "gabela de guiços", um "carólo de centêo", um "cibo d'áuga", e um "assenta-t'aqui nu mou colo que te quero intcher de mimos". E pelas "cincrôas" que me dava para "ua chicla" ou "prós doces", pela paciência com que aturava as perguntas da impaciência de menino enquanto íamos "prá Canêlha". E agradecer, de igual forma, ao "Ti Guardiano", que sempre vi como o "bó" que nunca tive, por ter tentado ensinar-me a diferença entre "ua aixada e um satcho, entre ua fouce e ua seitoura", "cmu se botaba um baraço n'ua saca de batatas" e, já que menciono batatas, por me ter mostrado o prazer de substituir um copo de refrigerante por "ua pinga no mata-bitcho d'árranca"... E que, seja lá o que isso for, descansem em paz dos trabalhos que tiveram em vida. E dos ensinamentos do Dialecto Transmontano, também...

1 comentário:

deep disse...

Os escritos que por aqui se lêem são bem o testemunho linguístico, cultural e sociológico da identidade trasmontana. Quem quiser saber como por cá se fala (pronúncia e léxico), é chegar até cá. Lendo-o, como quando li "O Diabo Veio ao Enterro", tenho a sensação de estar a ouvir o mais genuíno trasmontano. :)

Votos de boa semana.