Bem Vindo às Cousas

Puri, se tchigou às COUSAS, beio pur'um magosto ou um bilhó, pur'um azedo ou um butelo, ou pur um cibinho d'izco d'adobo. Se calha, tamém hai puri irbanços, tchítcharos, repolgas, um carólo e ua pinga. As COUSAS num le dão c'o colheroto nim c'ua cajata nim cu'as'tanazes. Num alomba ua lostra nim um biqueiro nas gâmbias. Sêmos um tantinho 'stoubados, dàs bezes 'spritados, tchotchos e lapouços. S'aqui bem num fica sim nos arraiolos ou o meringalho. Nim apanha almorródias nim galiqueira. « - Anda'di, Amigo! Trai ua nabalha, assenta-te no motcho e incerta ó pão. Falemus e bubemus um copo até canearmos e nus pintcharmus pró lado! Nas COUSAS num se fica cum larota, nim sede nim couratcho d'ideias» SEJA BEM-VINDO AO MUNDO DAS COUSAS. COUSAS MACEDENSES E TRASMONTANAS, RECORDAÇÕES, UM PEDAÇO DE UM REINO MARAVILHOSO E UMA AMÁLGAMA DE IDEIAS. CONTAMOS COM AS SUAS :







terça-feira, 31 de maio de 2011

Cousas de Morais

Não será incomum assistir ao despertar do interesse pelas raízes, sempre que delas fazemos parte. Aconteceu, recentemente, com gente de Morais... Dedico-lhes esta partilha do acumular de paixão pelo concelho que carrego nos genes... "Bem m'ou finto que num me paguim um copo, de torna-jeira, quando me der na catchimónia d'ir ber calhaus ó Monte de Morais outra bêze"! Mas adiante... Numa banalidade não chocante, será lícito começar qualquer história com "era uma vez"... A bem da retórica, não é de descartar que tudo tenha começado por ter sido uma vez, acrescida de tantas outras, e outras mais. Como tal, era uma vez um povoado, gémeo de tantos outros brotados da conquista de montes e vales, gerado provavelmente nas entranhas das tentativas de povoamento encetadas nos primórdios dos da dinastia de Borgonha. Remetam-se as lendas para o imaginário popular, ocultem-se Árabes que pouco devem ter respirado os ares do "umbigo do mundo" e avance-se no tempo, até aos Moraes, talvez, dizem-nos provindos de terras de "nuestros hermanos", Morales sendo. Dizem os nobiliários que o primeiro dos Moraes (Gonçalvus Roderici - ou Ruiz - de Moralis) vassalo foi do pai da nacionalidade (e do filho e do neto). Afirmam-no descendente dos Senhores de Soria, cidade espanhola que teve Fortún Lopez como seu primeiro Senhor. «E todo achesto confirmamos in Soria, delant el sennor Fortún López, e delant sua mullier donna Sancia, e delant sos fillos el archidiacon don García e donna Navarra e donna María». Vulgaridades muitas de medievais épocas, a "donna Maria" do documento transfigurou-se em D. Leonor Fortunes, de núpcias celebradas, mãe foi do 7º Mestre da Ordem de Calatrava, Rodrigo Garcez de seu nome, pretenso progenitor do nosso Gonçalo Rodrigues, epitetado de 1º Senhor de Morais. Porém, a História da Casa de Lara nos pinta como descendentes do dito Mestre de Calatrava, Gomez Ruiz, Fernan Ruiz, Garcia Ruiz e Leonor Ruiz, nada constando acerca da paternidade do nosso Gonçalvus Roderici (ainda que o Ruiz soe a familiar). Verdade é que não deve descartar-se uma qualquer bastardia, fenómeno banal à época. Mas o Mestre de Calatrava não circulou por estas bandas, detendo-se em incursões mais meridionais às "turras com a mouraria", bem como por terras do Reino de Aragão. Morais poderá efectivamente ter sido fundada por um descendente do Senhor de Soria. Ou talvez não... Ter-se-á passado o inverso, dando o fitotopónimo (terra de amoreiras) nomenclatura à família que o povoou? Subjectivamente, creio mais na segunda das hipóteses. O resto soa-me a histórias encantadas... Mas é inegável que os Morais assumiram algum protagonismo a partir de inícios do séc. XIII. Facto consumado pelos registos da assumpção do neto de Gonçalo Rodrigues, Ruy Martins de Moraes, ao posto de alcaide-mor de Bragança pelos finais do séc. XIII - inícios do XIV. A posição de destaque é-nos confirmada pelas Inquirições de D. Dinis, mostrando-nos o "Roy Martyns cavaleiro" como digno "filho d'algo" proprietário de duas quintas em "santandre de moraaes". E prossegue a saga do hábito de alcaidaria, já que o neto, o célebre João Afonso Pimentel, o tal que afinidades gerou com Castela e conduziu, por tal, o Mestre de Avis, o Condestável e o nosso Martim Gonçalves de Macedo a estacionamentos por terras de Castelãos, de igual forma o foi. Mas, estranhas leituras, por meados do séc. XIII, na nobilíssima freguesia de Morais parece ainda não ter sido adoptado o apóstolo André como padroeiro, constando a mesma como "parrochia sancte Marie de Moraes". Recuará a esta época a adoração à Senhora do Monte? Conjecturas, apenas... Conjectural não é observar que os donatários da excelsa paróquia nada teriam a ver com os Morais. Se acreditarmos piamente nos depoimentos dos moraenses "Michael ferndanj", "Menendus petri", "Petrus iohannis", "Andreas petri" e "Johanes martinj", a propriedade de "tota ipsa villa fuit de Petro ayrie milites et de suis germanis". Mais acrescentam que Morais era, ao tempo em que decorreu o inquérito, propriedade da descendência de Pedro Aires. Estranha esta peremptória afirmação quando, a ser verdade a proemimência dos Morais, a "villa" deveria ter como proprietários, ou o seu pretenso fundador, Gonçalo Rodrigues de Morais, ou o seu filho, Martim Gonçalves de Morais. Acresce que, para lá da família Aires, os detentores de direitos territoriais em Morais eram os Templários e os Hospitalários, por doação dos pais do conhecidíssimo Meirinho-mor de Portugal, Nuno Martins de Chacim. Por mencionar o primeiro verdadeiro "polícia do Reino", e para incrementar as dúvidas, o senhor "Andreas domingo" de Talhinhas diz-nos que metade da "villa de Moraes" era do dito meirinho-mor. Nada que espante, atentando nas usurpações territoriais do Senhor de Chacim... Coisas... Curiosidades outras, a quando remontará a fundação de Morais? Ficamos a saber, pela dita doação às Ordens do Templo e do Hospital, que Morais já teria existência segura desde o reinado de D. Afonso II (1211-1223). Mas, provavelmente, até já a teria de período anterior, pela referência, em duplicado, relativamente à igreja que "fuit facta de vetero", ou seja, já era antiga (não sendo possível, obviamente, estabelecer o quão antiga). Mas, se dúvidas houver relativamente à antiguidade, fica a saber-se que, por inícios do séc. XIV, Morais já deveria ter uma dimensão considerável para a época. Basta determo-nos na informação constante da listagem de contribuições para a guerra marítima à "mourama", por 1320: nas Igrejas correspondentes à Terra de Lampaças, a de "Santo André de Moraes" figura no terceiro lugar dessa mesma lista, apenas suplantada pela de Izeda e, tempos outros de magnificência outra, pela de Castro Roupal. Pense-se apenas que Morais foi taxada em cem libras e Macedo em trinta... E, já agora, será desta época a Igreja da Senhora do Monte? Impossível afirmá-lo, pelos dados disponíveis. Saber-se-á com segurança, pelos pouco elementos visíveis da sua configuração arquitectónica, que será um templo de características medievais-cristãs, presumivelmente construído na Baixa Idade Média. E sabe-se, ainda e provavelmente, que não lhe terá estado associado nenhum povoado, tal como é referido pela memória popular. Nas suas imediações não são visíveis quaisquer vestígios que para isso apontem, nomeadamente testemunhos de estruturas habitacionais ou resquícios de actividades associadas a um aglomerado populacional, nomeadamente cerâmicas. A hipótese interpretativa mais viável, atendendo aos paralelismos com outros povoados, residirá na implantação deste que poderá ter sido o templo principal de Morais numa área marginal ao povoado. Ao que tudo aponta, por finais do séc. XVII - inícios do XVIII, a área de culto ter-se-á deslocado para o interior do povoado. A última notícia efectiva relativa à existência de culto na Igreja da Senhora do Monte remonta a 1755, ainda que haja nota da sua existência como ermida nas Memórias Paroquiais de 1758. Mas desde o primeiro quartel do séc. XVIII se pode antever o seu progressivo abandono. Data de 1720 o aviso de um dos Visitadores, ameaçando o templo de demolição caso os mordomos não procedam às reparações devidas, colocando no seu lugar uma simples cruz para perpetuar a sua existência. É um facto que, poucos anos após lhe é dada a benesse de ser considerada um templo decente, sem necessidade de novo benzimento. No entanto, o presente é testemunha do prenúncio de morte... Falemos um pouco da actual igreja de Morais... Diz-me um notável moraense dos sete costados que nela consta a data de 1705. Nada mais normal, atentando na referência anteriormente feita de transladação do templo para o interior do povoado por finais do séc. XVII - inícios do XVIII. De facto, é ponto assente que o actual local de culto já existia, seguramente, em 1701. Creio, no entanto, que a sua fundação poderá recuar até ao último quartel do séc. XVII, pela referência a uma visita de verificação à igreja de Edroso levada a cabo em 1681 pelo Reitor de Santo André de Morais. No que respeita à data de 1705, a mesma deve referir-se, com toda a certeza à conclusão das obras necessárias no edifício, já que em 1703 é imposta aos fregueses de Morais a execução de um novo púlpito com escada em cantaria. Nesse mesmo ano o Bispo de Bragança, D. João Franco de Oliveira, efectua uma visita à igreja de Santo André (com o intuito de verificaçao das condições do templo). A configuração actual da igreja resultará das constantes alterações nela efectuadas, ao abrigo das anomalias descritas pelos diversos Visitadores da diocese. A título meramente exemplificativo, em 1716 é referido que as paredes e o tecto da capela-mor se encontram em ruínas... O resto são as memórias das pedras... E da gente... Acrescidos do particular desejo de um mecenas que ressuscite o magnífico templo ignorado pelo desprezo humano. Ouvi por lá as preces dos tetravós de Morais... Em sua memória perscrutei o solo, homenagem prestando aos resquícios plantados a pedaços de telha de meia cana que povoam as imediações da igreja da Senhora do Monte. Ou a sorte da detecção de um isolado e abençoado prego que deve ter servido de amparo a uma qualquer porta da Senhora do Monte... Guardo-os, religiosamente, para a posteridade... Partilhando-os, numa divina simbiose com as consequências da minha adorada ignorância...

sexta-feira, 27 de maio de 2011

A santidade das pedras

Repousam na execrabilidade da incúria, fustigados pela intempérie da rejeição. São pétreas árvores apodrecidas que um dia albergaram humanos frutos desenhados a alma, fontes de benta água que, diabolizada a antrópica essência, de oásis lhes resta a vegetação que oculta o deserto. Por vezes, penetrar nas entranhas deste maravilhoso reino equivale a verter secas lágrimas pelo odor a putrefacção das pedras, oco aroma a vazio do que preenchido foi. Talvez seja um asfáltico vírus potenciado a betoneiras, ou a selvajaria de um certo sonambulismo arbitrário, soporífera conexão de digestivos sistemas ao armazém do espírito, quiçá. Cosam-se os anéis, remendem-se os dedos, toque-se ao de leve a textura do abandono. Facultem-se óculos a dimensões muitas, veja-se um mundo de oculta densidade debruada a fantasia. Perscrute-se a seiva das pedras, ouça-se-lhes o silêncio, sensibilizem-se os ouvidos para o eterno gemido que paira numa ruminante tela de desprezo. Há fantasmas assim, ascetas de empilhados calhaus, teimosamente resistentes na sua periclitância de audaz verticalidade. Num passado não muito distante ouviram as preces da anónima gente de Morais ou Banreses, pagadores de promessas à Senhora do Monte ou a São Geraldo, círios acesos, corações ao alto, paramentos na exultação do divino. Um dia, humanas comodidades, ou microbianas tentações, volta-se as costas ao aconchego, fecham-se as portas, se as há, alteram-se votos, veneram-se santos outros. Talvez seja assim a espécie, ingrata, despudor dos tempos. Encerra-se um ciclo, choros de despedidas muitas, o suponho pelo secreto rumor do resistente xisto. Olho extenuado para o altivo campanário da igreja da Senhora do Monte, rosto de virtude perdida, orgulhoso do seu passsado apagado a chuva e vento, a agrestia de neve e geada, a sufoco de escaldante sol, em ténue equilíbrio de vilipendiada majestade, esquissada a patranhas de ignominiosa negligência de quem não sabe honrar os testemunhos da ancestralidade. Em Banreses saboreio, por breves instantes, o eco das orações de gente simples, talhada a campo, vergada a rugas do tempo, mãos calejadas pelo tormento de agrícola faina, domingueiros fatos de respeito ao culto. Na efemeridade de um devaneio, regresso à civilização, histórias tantas por desvendar, realidades do desrespeito por fantasmas que pacientemente aguardam por condigno féretro. Ou, ingénuos desejos de ressuscitação patrimonial, despertar um dia vassalagem prestando à musicalidade dos sinos de um indómito campanário de xisto, inexpugnável reduto de glorioso passado. Talvez me tenha ouvido a pretensa santidade das pedras...

Fugas no Reino das Pedras

Os dias embrulhado pelo afago das pedras são assim. Calmos, extirpada a canícula de final de Maio assemelhada à de Augusto mês. Sedentos, de inenarráveis amizades seladas a amenas cavaqueiras sob a protecção de um publicitário guarda-sol. Extenuantes, por indescritíveis incursões às profundezas deste mar pétreo, aparentemente esquecido pelo carácter protector da divindade... Será o olvido premeditada forma de preservar a essência, nada mais que a essência? Hoje senti-lhe o âmago... "Por mares nunca dantes navegados"... Há gente assim, que a troco de nada, insondáveis (ir)realidades da modernidade, nos presenteia com o calor de um singelo sorriso pela partilha do muito que sabe acerca das entranhas deste oceano de calhaus que me viu nascer. Talvez hoje a palavra deslumbramento seja ínfima para traduzir o encantamento dos sentidos pelo saborear da verdadeira natureza em estado virgem. Mas não só... Há disponibilidades que não se pagam, preços que existência não têm, moram apenas num estranho recanto onde vive gente que já não acreditamos existir. Mas existe... Hoje confrontei-me com essa clara evidência. Mas públicos encómios não são o meu timbre e saberão os destinatários dissecar a gratidão... Adiante, que o todo-o-terreno vociferando vai, esfaimado que está por deglutir as artérias trajadas a pó e pedra, ornadas a herbáceas testemunhas de ancestral calcorrear. Esventram-se os aromas, reduzindo-os à paixão de, paulatinos inícios, barrarem qualquer incómodo causado por desenfreados insectos arrancados à sua paz. Cheira a terra, a terra-mãe, inconfundível e inimitável perfil aromático. Repentinamente, uma espécie de orgia dos sentidos. É a raposa que, sorrateira mas curiosa, observa os invasores. São as aves de rapina que nos sobrevoam, num aéreo bailado que sabe a eternidade. É o espanto de uma cegonha que nos observa do seu altaneiro ninho. São os sons a nada, numa orquestra de silêncio quebrada a intenso chilrear de quem rasga céus e pousa, espantado, nas arbustivas formas que pintam as encostas a cores de encanto. Ou um zumbido aqui, outro acolá. E o canto da brisa a acariciar o escalpe, ou a melodia do ribeiro que corre indiferente ao cágado que nas suas águas repousa. Isto não se explica, não se mostra, não se escreve sequer. Sente-se, apenas. Sente-se quando nos damos permissão a fundirmo-nos com a terra, numa improvável fusão em que as pedras são participantes e do elenco fazem parte as silvas, os cactos, as giestas, as estevas e sei lá que mais espécies que tentam vedar-nos o passo. Sente-se quando nos embrenhamos no desconhecido, sabendo de antemão que ali está o útero onde repousámos, o ventre que há-de aconchegar-nos se perdermos o norte, a mãe-terra, a protectora, a suave ondulação que nos embala. Hoje sentei-me no regaço da mãe...

sábado, 14 de maio de 2011

Balada das rugas tristes

Gemem os velhos, de farrapos tratados, encostados a indistintas memórias de um refulgente passado, num "escano" carcomido pelos anos ou num "motcho" corroído nas articulações de que desprovido está. Sozinhos, preferencialmente sozinhos, no remanso de uma eterna solidão, esquecida gente que um dia gente foi. Vivem à sombra do tempo, abrigo possível no lento esganar, roendo a agonia em sepulcral silêncio, na rapidez de ponteiros que tardam na sua inexorável marcha. O futuro, o indesmentível futuro que a todos toca, servir-se-á em caminhos cravados a ervas daninhas, quem as limpe não há, haja quem sobreviva para as calcar a carpir de despedida última. Se gente sobrar de "companha" para derradeiras viagens... São os velhos, impiedosas rugas rasgadas a vida, dura e tormentosa vida, testemunhos de um pretérito sulcado a arados feitos de "candiólos", epiderme engelhada a "carambina", "scarabanadas" de trabalhos muitos, faces traçadas a pregas do estio. E merecem tanto carinho os velhos, os nossos velhos, odores de ancestralidade, aromas a genes de pedra. Mas são morbidamente apagados, absorvidos pela esponja de um atroz esquecimento, empurrados de encontro a paredes de xisto, também elas a aguardar um lento finar, verticalmente enfileiradas, quando calha, moribundo silêncio entrecortado pela brisa de uma estatística que lhe desperta o torpor. O "Retrato Territorial 2009" trouxe-me a evidência do que evidente já era: demograficamente, estamos a definhar de forma lenta e penosa. Em apenas uma década, tão somente um mísero par de lustros, diminuímos a densidade populacional, coisa pouca para o que pouco já era. Veja-se o decréscimo a linguajar trajado a política e descortinar-se-á o positivo: afinal, semelhante fenómeno é visível em cerca de 50% dos concelhos do território português, na sua grande maioria situados no lit... ops... interior. "Co mal dos outros bem m'ou bêjo"! Segue a procissão dos estatísticos indicadores, antes da chegada do "Censos 2011"... O concelho macedense, no período 2000-2009, viu a sua taxa de variação de crescimento natural enquadrada no fabuloso grupo dos que decresceram entre -10 e -4% (há piores)... Coisa medianamente compensada pela equivalente da componente migratória: situamo-nos no pelotão dos que cresceram entre 0 e 3,5%... A voracidade vai devorando os quadros e mapas, em busca de algo que atenue este triste sentir. Mas nada, nada de nada! A taxa de fecundidade diminuiu, o índice de envelhecimento incrementou... A proporção da população entre 0 e 14 anos teve uma variação negativa, em apenas 10 anos, situada no intervalo de -4,9 a -2,9%. Em contrapartida, a homóloga da população com idade superior a 65 anos teve uma variação positiva entre 2,6 e 4,8%. Oh inclemência dos deuses! Graves actos devem ter sido os desta humilde gente que, como todos, envelhece. Mas não assiste a rejuvenescimento, senta-se, apenas, aguardando na pacatez de uma soalheira tarde, ou amansando o tormento invernal na companhia de um "strafogueiro e uns guiços". Um dia, num não muito longínquo futuro, talvez surjam mais Banreses, frutos em bolorenta compota, vestígios de albergues de vida. Olhe-se, exemplo extremo, para os destemidos 60 habitantes que os "Censos 2001" apontavam para a excelsa freguesia de Soutelo Mourisco, "ajuntada" com Cabanas e Vilar d'Ouro. Sinta-se, na efemeridade de uma incursão vespertina, o pulsar do silêncio da serra, prenúncio de morte do qual um felino não consegue fazer-nos abstrair, pressintam-se os abutres a sobrevoar a carcaça. Estão lá, ao longe, em sádico sorriso de necrófago que aguarda pacientemente pelo concretizar da coutada... Entretanto, louvem-se os velhos, os nossos velhos, na sua silenciosa e ineficaz contestação do abandono... (Com uma enorme gratidão ao Paulo Patoleia e ao Valter Cavaleiro pela cedência dos magníficos registos fotográficos)

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Cousas de xisto

POR FAVOR, PREVIAMENTE AO VISIONAMENTO, RETIRE O SOM À "COUSAS RÁDIO"...


Há mundos que se entranham na alma...


domingo, 1 de maio de 2011

Ventos da montanha

Imagem do berço, donatária de memória de vidas na corda bamba da incerteza, quando, numa qualquer Sexta-feira do estio, idos desacertos, se apela ao anjo Urze Pires e ao amigo dentista Simão, juntem-se-lhes os arcanjos "operadores de Mirandela", Mário Rafael e Mexedo, Caiado anestesista, amostra de vida, novel pedaço de memorandos futuros, haveria um dia de parir "cousas" da terra, "cousas" poucas brotadas do orgulho, de imberbe arrancado ao materno ventre por imitações de popular etimologia derivada de pretensos nascimentos de imperadores, cesariana ou cesárea a pintam, incisões num tempo em que os ponteiros eram pautados a sabe-se lá por que corrompido silêncio... Homenageiem-se as Mães, Adelina, Júlia original de Maria, matriarca de prole muita, não teve exemplo a seguir na filha que rebento único gerou; fite-se o tempo em recordações de adoptiva encarregada, Carolina mãe o foi também, desigualdades de etária faixa esbatidas, agruras de forçada ausência de alfa macho, contingências de prematuro finar. Louve-se a mãe outra, depósito de principado do reino que vem, fiel depositária dos genes, ópera de Verdi, caroços de amores muitos, "carabunhas" talvez, fusões que um dia esquissaram o sucesso, olhos ardentes, alavancas de profícua permanência de um Álvares qualquer, Álvaro-filho, etimologias o afirmam, ou profeta de nome. Exacerbem-se os genes, de hispano-godos talvez, ou suevos quiçá, primogénitos brasões de nacionalidades a encarnado pintadas, quarteto de meias-luas traçados, heráldicas tantas de insondáveis pesquisas, linhagens o argumentam, irrefutáveis pendões de pentágono completado a Bragança, Maia, Baião e Ribadouro. Mas, humanas mães o perdoem, de sapiens capacidade o perdão, erga-se o templo a progenitora outra, sacralize-se a terra, humanize-se o ventre de pétreo ser, telúricas formas do útero, coito do ar com o solo, inimagináveis fusões de impenetrável paixão. Sou filho das pedras... A montanha como mãe, o vento como pai, insano calor do inferno como progenitor, madre arrepiante geada de Inverno. Sou descendente dos lobos, cruzamento com rebanhos de ovelhas e cabras, histórias muitas de arrepiar, filho da Lua e do Sol, raposa a mãe, javali o pai, desconexas ligações o dirá o bom senso. Há nascimentos de uma gravidez do pó, entranha-se a terra nos órgãos, vem o sangue desenhado a eritrócitos com hemoglobina de xisto, e as defesas de leucócitos firmadas, hematologia o diz, vem levantada a castelos de brancos glóbulos de neve, muralhas erguidas a suor de intranspirável medula. Talvez este paradoxo de progenitores muitos prefácio tenha em rupestres pinturas de Foz Côa primas, siga-se o rasto de futuras submersões, Sabor selvagem o foi, lá para a Levada Velha ou em setentrional concelho auroques esboçados. E os tetra-tetravós, de sedentarização arcaicas formas, fugas muitas num Buraco da Pala de vizinho concelho, ou meridional Zedes, megalíticas erupções de antrópico sentir, vá-se em romaria ao bispo santo, Ambrósio de cegos milagres, mamoa escondida de desvendada ancestralidade. Sigam-se os trilhos, perscrute-se a ansiedade do destino sem meta riscada, trepa-se a Xaires, dos primórdios os metais, respira-se a essência de Bornes, dos Corvos dizem o penedo, Bronze o achado em arqueologias de regressivo sentir. Deglute-se uma refeição de Zoelas, território o fomos, netos e bisnetos, descendência da unicidade respeitada pela gente do Lácio. Romanos teremos sido, latinas empresas herdámos, lugares perdidos em testemunhos de tégulas ou sigillata, Egica ou Vitiza por cá deixaram legados, em cargas de distinta coloração do olhar, do escalpe também, Bárbaros que em Laetera cunharam monetários vícios. De Mouros, lendas muitas, vestígios poucos, nulos o digo, talvez Alfandica raro exemplo seja, lá longe ao virar da esquina do dorso de Montemé. Sou filho das carcaças de histórias muitas, honro as mães, as puras, as virgens, e as de donzelas tributos, as outras também. Sou filho de ventos da montanha, prole de um mistral em anómala simbiose com um suão, de oliveiras descendo, ouriço-azeitona serei, castanha que azeite dá, num pão de batata ceifada, centeio arrancado cozido num pote, e uma alheira com sabor a pedaços de solo enrijecido pela estiagem, enrugado pelo tormento dos nove de residência de Belzebu, saciado por flocos de neve ou choros intensos do céu. Neste dia de todas as Mães, honro as minhas, carnais e adoptivas, reais e imaginárias. Mastigo um pouco de ficcional parada, desfile de calhaus, xisto a um lado, granito a par, vertentes de alegre sentir. Sou filho das pedras... Honro-as também... Sou filho do Reino Maravilhoso... E sou filho da minha "vila"... Pátria-mãe...