Bem Vindo às Cousas
Puri, se tchigou às COUSAS, beio pur'um magosto ou um bilhó, pur'um azedo ou um butelo, ou pur um cibinho d'izco d'adobo. Se calha, tamém hai puri irbanços, tchítcharos, repolgas, um carólo e ua pinga. As COUSAS num le dão c'o colheroto nim c'ua cajata nim cu'as'tanazes. Num alomba ua lostra nim um biqueiro nas gâmbias. Sêmos um tantinho 'stoubados, dàs bezes 'spritados, tchotchos e lapouços. S'aqui bem num fica sim nos arraiolos ou o meringalho. Nim apanha almorródias nim galiqueira. « - Anda'di, Amigo! Trai ua nabalha, assenta-te no motcho e incerta ó pão. Falemus e bubemus um copo até canearmos e nus pintcharmus pró lado! Nas COUSAS num se fica cum larota, nim sede nim couratcho d'ideias» SEJA BEM-VINDO AO MUNDO DAS COUSAS. COUSAS MACEDENSES E TRASMONTANAS, RECORDAÇÕES, UM PEDAÇO DE UM REINO MARAVILHOSO E UMA AMÁLGAMA DE IDEIAS. CONTAMOS COM AS SUAS :
sábado, 5 de junho de 2010
Abonda di um rodilho…
Hora do almoço, por entre “testos, sertãs, caçoulos e ua nabalha”… Reedições desta alma transmontana que não arreda pé… Como se a essência se renovasse a cada aragem com que a serra ameniza este tórrido calor que, a manter-se a toada, transformará os três de Inferno num quarteto ou num quinteto. Hora de “intcher o bandulho”… Com um “cibo de pito” dos que sabem ao vagar com que se “ac’moda a tenda”. Aromas que amansam esta fome de terra, ar impregnado de mágicos tormentos do espírito, volatilidades que emergem da humildade de um “tatcho” que guarda imensas histórias “strugidas” para contar. É sempre assim, assim foi sempre. A riqueza brotada deste ócio de transmontana gula, pecado não é, que a simplicidade dos humildes não consta da negra lista dos sete. Um trago de fresco néctar… Cruzadas conversas, e o refúgio no ascetismo de uma realidade sonhada, por entre montes… De emoção… Bucólicos espaços, guardadores de rebanhos de solidão, seres petrificados numa secular vivência que vida já teve e de vida se vê amputada. Um regato, distinto regato, outras azibescas crónicas registadas. A paz, ou o pouco que dela resta, semeada pelo silêncio de fantasmas que por aqui andaram, “satchos e aitchadas” em punho, “seitouras” em riste, uma “segada ou ua ácarreja” do tempo, memórias ventiladas pelas folhas na incomunicabilidade de indecifrável linguajar vegetal. Percebo-lhes as dores, apenas, e isso basta. E entro-lhes na seiva, solidariedades de quem da mesma terra brotou. Sinto-lhes as dores, também, como se os meus membros fossem uma inusitada extensão das ramificações que se entretêm num estranho bailado ao som de uma orquestra onde se conjugam os sons do refrescante vento e do sol abrasador. Por breves instantes, deixo que as minhas raízes penetrem profundamente na terra da qual sou feito, deixando-me irrigar pela água que segue o seu percurso até ao Sabor. O tempo pára, para um reabastecimento do ser, fortuitas descobertas do local onde realizei o meu primeiro acampamento escutista. E senti, de novo, o negro cavalo de ferro que aterrorizou os putos de lenço amarelo ao peito… A ponte ganhou vida, numa intemporal brevidade de confusões nostálgicas, comboio saído da moribunda estação do Azibo, fumegando, vociferando contra os enganos, numa corajosa corrida contra a resignação desenhada a carris enferrujados, flores fúnebres depositadas ao longo da sua memória, pretéritas luzidias formas, regaço de toneladas de ferro movido a carvão. O monitor do tempo apagou-se, entretanto. Tempo de fugas para outros cardeais pontos, onde resistentes searas abraçam o gigante, deixando-lhe o dorso de guardião a desenhar os contornos do horizonte. Outros horizontes se levantam… O vento fustiga as alegres mentes que vislumbram um planáltico mar, ondas de prazer olhadas do alto, humanas aves, aladas formas de quem sente o desejo de um planado voo, sobrevoando esta paixão cravada numa tela de nunca inventadas tonalidades. O apelo do serpenteante caminho reduz o desejo e incita a uma cavalgada monte acima, onde nos aguarda um prolongado convívio com o choro de encavalitadas pedras, silencioso protesto de quem moribundo está, agonizando num abafado carpir de antigas mágoas, testemunhos de indómita gente que um dia fundou o paradoxal prazer de privar com as pedras, numa estranha harmonia com a aparência do inóspito. As pedras estão lá, içadas a seco suor de um doloroso abandono, digitais impressões invisíveis, sussurros de uma finada ancestralidade, murmúrios da contemplação de um mundo onde apenas sobrevivem heróicas faces fulminadas pelo tempo, tristes olhares de uma anciã que colhe umas ervas, tímido sorriso de quem vê a privacidade da sua solidão invadida por um alienígena, eterno amante desta esquecida província, “tchotchinho”, pensará ela para os botões da sua esfarrapada indumentária corroída pela agrestia do campo. “Buas tardes nos dia Deus!”… Seguida da pureza de um desconfiado olhar. Desconfiado fiquei também dos seus pensamentos… “Q’andará pr’áqui este tchabasquetcho a indrominar? Cousa boa num debe ser! Tchamo já o mou, q’inda l’abre a cabeça ó berde“… As “pitas” soltas, excepcionais formas de vida onde paira a túnica da desertificação, interruptores para um breve desvio de atenção. Em direcção ao astro que teima na sua ininterrupta aterragem, algures onde a pobreza é camuflada a mar. Tempo de descer também, numa despedida pintada a “até já”, saudade abreviada pela entrada em cena de inesperados actores. E pela esperança representada por eólicos seres que povoam o horizonte da irmã gémea, fraterna figura da outra extremidade. Por momentos, os agravos à terra amainam, num efémero esquecimento às injúrias a que este Reino vai sendo sujeito em constância. Ergue-se da imensidão do espaço a mística imagem do panteão de indígenas divindades, talvez por lá more um transmontano deus, Aernus poderá ser. Talvez escute o silêncio das preces, talvez aceda a um “ex voto” de Zoelas descendentes, talvez tenha sido o obreiro do repovoamento de Castanea sativa, divina intervenção, que força braçal exígua é. A sonoridade do encanto esvaiu-se num regresso à realidade… Era hora do almoço… Do fundo do túnel desta prazenteira letargia, a voz da ancestralidade... “- Dromes? Atão num bês que s’arramou um cibinho d’auga? Abonda di um rodilho!”…
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2 comentários:
Tornei-me seu visitante quase diário e a culpa é sua por me fazer reviver cousas do outro lado do rio.
E agora lembro-me a prenda que pedi ao meu pai quando fiz a 4ª classe.
Como éramos vários irmãos era normal que fizéssemos alguns trabalhos agrícolas de acordo com as nossas posses. Um desses trabalhos era ir segar ferranha ou erva para as vacas. Utilizávamos para o efeito uma seitoura de serrinha. Aquilo era um desastre, cortavam mal e erapreciso estar sempre a aguçá-las. Para os mais velhos aquilo era uma limpeza porque utilizavam seitouras de lâmina com dedais e tudo.
Como fiz a 4ª classe achei que já tinha direito a ser grande. Enchi-me de brios e então pedi-lhe uma seitora de lâmina.
Claro que não fui atendido, era perigoso, apesar de já ter a quarta classe.
Imainada!
António Magalhães
Caro António, repito o que já por aqui disse. As suas histórias são sempre bem vindas! Muito obrigado pelas suas visitas!
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