Coisas há que nos acicatam esta soberba de às pedras ter pertença.
Como se os desafios se sucedessem, numa amálgama de formas aparentemente
desconexas, entre prefixos e sufixos, radicais tantos de heranças latinas,
árabes, helénicas e outras que tais, bárbaras até, os clássicos o diriam. De
quando em vez, sofro deste achaque de contrariar o estabelecido. Demência, o
dirão os intelectuais que, avantajado pedantismo, se servem à sobremesa do que
vomitado é pela plebe… Afinal, Chacim não era adaptação linguística do arcaico
“porco selvagem”, nem chacina de Árabes seria… Solte-se o porco ou tire-se
coelho da cartola, não o derivado das pedras, antes o parido na humildade de
ter a pretensão de contrariar o estabelecido. Repiquem os sinos da mente!... E
recensões académicas venham à causa…
Mas deixemos o “Flacco” de lado e esqueçamos a “villa Flaccini”,
outras que tais, que de sericicultura foram outras épocas desenhadas. É tempo
da suavidade sedosa de folares a tecerem o êxtase de gustativas papilas,
adornados a inconfundíveis aromas desprendidos pela “tchitcha” que recheio lhes
dá. É a tradição a marcar pontos neste infame jogo de gula ancestral. E a
eterna e histórica dúvida sobre “dunde carbalhitchas s’indrominou o folare”?
Descansem culinários peritos, imiscuir não me vou na excelência do que
excelente é. De receitas quero saber-lhes apenas o resultado… E o registo das
etapas… Ou inventá-las… Mas ao que interessa vamos…
Qual o significado de folar? Dúvida dos tempos, incisiva questão,
dicionaristas se consultem, na embasbacada postura de possuir o dito folar uma
origem obscura, especialistas dixit, impossível sendo atribuir-lhe, com
segurança, um étimo latino... Como só acreditarei incondicional e piamente na
ida à Lua quando lá “botar as patas”, de S. Tomé influências, pruridos me gera
esta coisa de os ditos especialistas “botarem” obscurantismo na paternidade do
vocábulo “folar”. Quando provo a iguaria, sabe-me a tudo menos a filho de pai
incógnito… Ou a resquícios de germânico bolo, “flado” o diz o insuspeito
Moraes, como se o mel algo tivesse a ver com o folar. Ou “poularde”, como o
afirmam Faria e Lacerda. O folar derivado de frango?! De frango?... Creio mais
nas derivações lendárias de Mariana e Amaro, mais o fidalgo sem nome,
“floralis” o dizem os entendidos. Creio mas não acredito! Insuficiências de
descrente… Só porque, raridade legada pelo “Tabellião” da excelsa vila medieval
de Ferreira de Aves, lá para finais do séc. XIII, feito foi um “emprazamento”
de metade de um moinho localizado em Folares. Onde? Folares??? Hummmm…. Dizem
actuais cartografias que a dita Folares do documento evoluiu para Forles.
Auscultem-se, de novo, os entendidos em toponímicas questões e de Folares a
Forles influência terá tido a antroponímia de Froila derivada.
Coisa em que,
massa de farinha e ovos pelo meio, não acredito. Mais coisas da descrença… E
adiante que, suspeitas da gula, lá me conduziu o folar à fogaça, iguarias de
Terras de Santa Maria. Daqui a terras da península itálica foi um salto de
pulga… E apareceu a “focaccia” a esgrimir argumentos. Mergulhe-se nas
“Etimologias” do célebre Isidoro, lá para meados do séc. VII, e já por lá se vê
a “focaccia”, meandros do fogo, “focus” para os pais da latinidade. Do fogo
sairá, mundo pagão dos Deuses Lares a acrescer, no feminino de “focácius”.
Talvez me “botasse” agora a um “carólo” do bem latino “panis focacius”… Há-de
ter evoluído, tê-lo-á feito, seguramente, ou não teríamos hoje o “focolare”…
Digo eu, na insapiência vertida de uma qualquer adquirida ignorância. Ou não
nos dissesse a De Laude Virginitatis que
o conduto se “coctura in focularibus
praeparata”… Derivações de paternidade em “foculare”…
Avance-se até ao medievo, das trevas lhe chamaram,
erradamente o direi. Voemos até à Baixa Latinidade, ao “focagium”, imposto de
feudalistas timbres, por cá derivado em fumádego, direito de fumagem ou fogaça.
Lá teria de haver explicação para se contarem fogos ao invés de casas… E já se
pagava uma imberbe forma de IMI… Aos desgraçados dos contribuintes, «alem
do foro a que sam obrigados e concertados com o senhorio oyto alqueres de
fogaça»… Só para um exemplo citar…
Ou outro, lá para o séc. XII: «…Et in servicium
unam fogazam de duobus alqueiris tritici…». Por estas bandas, também os
ilustres donatários do infeliz Mosteiro de Castro de Avelãs se rogavam ao
direito de considerar os que em suas terras moravam «bassalos do mosteiro» e «pagam mais de fumadego cada
hum para acender foguo quatro dynheiros e meio». E das obrigações seculares,
dos tempos evoluções, se terá passado para as religiosas. Como diz o
inestimável Abade de Baçal, «Também na mesma semana gloriosa os párocos visitam
as casas dos fregueses, lançando-lhes água benta e suplicando a Deus que
prospere bem os moradores, ao mesmo tempo que levantam o FOLAR.» Ou resquícios
do «focagium»… Pagamentos em «focolare»… Ou em «fo(co)lar(e)»… Digo eu…
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